31 de mar. de 2013

June 15


Capítulo 23. 




Os garotos foram fazer a checagem de som na casa de show onde seria o concerto no Rio. Claro que os acompanhei. Quando voltamos de Angra, fomos direto para o local, Lisa ficou de ir para o hotel acertar tudo. Hoje tive a oportunidade de tocar guitarra, Thur cedeu a sua depois da checagem e, junto com Chay e Mica, deu-me as coordenadas. Também não é fácil. Harry apenas ria e tampava os ouvidos. Deixamos a casa de shows, almoçamos em um restaurante próximo e algo estranho aconteceu no hotel no Rio: Lisa me deu uma chave e deu outra para Thur. Como assim? Acho que fiquei mal acostumada. Notei que Chay também estranhou, mas procurei não falar nada, afinal Thur parecia bem familiarizado com a idéia. Fomos os cinco no elevador e chegamos ao nosso andar. Thur me deu um selinho e disse que depois conversávamos sobre aquilo. Chay foi para o seu quarto e Mica para o dele. Harry ficou no corredor, esperando Lisa. 

- Vai apodrecer aí – falei, rindo e ele riu, assentindo.
 
- Ué, não vai ficar com o
 Thur? – perguntou, vendo-me abrir a porta do quarto que ficaria. Ele estava com um olhar confuso, mal sabia que eu estava mais confusa ainda. 
- Então, parece que não. – Dei de ombros e ele ficou olhando para o nada, como se procurasse uma explicação.
 
- Talvez seja pra você ter mais privacidade. – Parecia querer me encorajar e eu sorri fraco, acenando e entrando no quarto. Pensei em ligar para
 Mel, mas estava tão cansada que mal deitei na cama e já peguei no sono. 

Acordei com o telefone tocando, Lisa pediu que eu me aprontasse, pois dentro de uma hora teríamos que sair do hotel e ir para o local onde eles iam tocar. Levantei e corri para o banheiro, tomei um banho razoavelmente rápido e me arrumei bem devagar, fiquei em dúvida no que vestir. Estava muito quente, então optei por uma blusinha regata verde escuro e uma saia jeans, depois calcei o All Star, penteei os cabelos e passei perfume. Saí do quarto e
 Thur saiu do seu, praticamente em sincronia. Ele sorriu abertamente e eu fiz o mesmo. Abraçamo-nos e demos um beijo rápido, porque Mica nos interrompeu mais uma vez com a sua frase "o amor move montanhas". Levou um pedala do amigo e outro meu. Chay e Harry já nos aguardavam na van, chegamos lá rapidamente e fomos o caminho inteiro cantando canções dos Beatles. A casa de shows estava entupida de gente. A fila para a entrada fazia voltas. Fizemos a volta e entramos por trás, mas algumas fãs realmente tinham pensado nisso e os atacaram quando desceram do carro. Não sei por que, mas tive a impressão de duas ou três meninas apontarem para mim, como se soubessem quem eu era. Ignorei e fiz o percurso para o camarim. Fui levada para a sala onde os meninos ficariam e logo depois eles entraram. Comemos muito, porque todos estavam morrendo de fome. Autorizaram a entrada das fãs para o Meet & Greet e elas entraram. Apenas olhava de longe, com os braços cruzados, pensando na vida e que talvez não dormiria com Thur essa noite, o que seria complicado para o meu psicológico. Depois que elas saíram, os meninos já tinham que subir ao palco. Abracei cada um e desejei um bom show, Thur me deu um selinho e subiu. Subi em seguida com Lisa e ficamos na lateral. Eu já estava familiarizada com todas as canções que estavam sendo tocadas. Vibrei ao começar a última, uma das minhas favoritas. "I Wanna Hold You". Comecei a pular em sincronia com a multidão e bater palmas, como Thur mandava todos fazerem. Comecei a cantarolar os versos, espantando-me por saber. 

"Tell me that you want me baby
(Me diga que você me quer, baby)
 

Tell me that it's true
(Me diga que é verdade)
 

Say the magic words and I'd destroy the world for you
(Diga as palavras mágicas e eu destruiria o mundo pra você)
 

An army for the broken hearted
(Um exército para os de coração partido)
 

Marching through the streets
(Marchando pelas ruas)
 

And every city's burning to the ground under your feet
(E cada cidade está queimando no chão abaixo dos seus pés)
 

Thur olhou para onde eu estava e apontou para mim na primeira frase do refrão, me deixando frenética.
 
-
 I wanna hold you (Eu quero te abraçar) 

My skies are turning black
(Meus céus estão ficando negros)
 

Feels like a heart attack
(Parece um ataque cardíaco)
 

And I'd do anything you ask
(E eu faria qualquer coisa que você pedisse)
 

I wanna hold you bad
(Eu quero muito te abraçar)
 

(...)

Enquanto o último refrão estava sendo tocado, Lisa me perguntou se eu gostaria de fazer novamente o que vinha fazendo nos últimos concertos: distribuir as toalhas quando eles passassem por mim. Assenti e ela me entregou quatro toalhinhas brancas. Fiquei esperando o concerto terminar, eles estavam realmente muito suados, porém felizes e aposto que com aquela sensação de missão cumprida. Afinal, este seria o último show no país. Harry deu as últimas batidas em sua bateria e eles agradeceram a todos por os apoiarem e estarem presentes. Falaram algumas coisas em português e foram extremamente aplaudidos.
 Mica foi o primeiro a passar por mim, entreguei sua toalha e ele agradeceu, enxugando-se e dizendo que tinha sido um dos melhore shows de sua vida. O segundo a passar foi Thur, entreguei a toalha e recebi um beijo na bochecha. Ele perguntou se eu gostei do show e eu respondi "muito, muito, muito", quase que dizia "ainda mais depois de você apontar para mim", mas decidi me calar e parar por aí. Harry passou, entreguei sua toalha e ele agradeceu, dizendo que precisava tomar água urgentemente e desceu. Chay já veio tentando me abraçar, dizendo que se eu gostasse mesmo dele, o abraçaria como estava: todo suado. Neguei e ele disse que estava magoado. Descemos e os garotos se encontraram com uns homens, que pareciam ser de alguma revista ou sei lá o que. Lisa me chamou e disse para irmos à frente, pois eles teriam que dar entrevista para um canal de televisão brasileiro e iriam demorar. Concordei, afinal estava precisando de outro banho urgente e ainda queria ligar para Mel. Despedi-me dos meninos e Chay pediu para que eu os esperasse acordada, pois fariam a famosa reunião pós-show em seu quarto. Concordei e ele continuou, pedindo para eu deixar a porta apenas encostada. Abracei cada um e saí com Lisa, minhas pálpebras estavam pesadas e eu estava pensando em como acharia forças para encarar rodadas e mais rodadas de cerveja no quarto de Chay. 

Chegamos ao hotel e fui para o meu quarto. Lisa disse que os meninos demorariam, aconselhava-me a nem esperar. Fiquei sem entender, mas ela os conhece como ninguém, então não questionei. Fui até o banheiro e tomei um banho rápido, vesti um babydoll que não tinha o short muito curto e tinha a blusa de manga. Abri a porta que dava acesso à sacada e fiquei observando o grande mar do outro lado da rua. Também fiquei vendo os carros passarem. Respirei fundo e senti a brisa do mar no rosto. Senti-me feliz novamente por ter a oportunidade de estar ali. Definitivamente, conhecerThur foi a melhor coisa que já me aconteceu. Ele é o responsável pelos melhores momentos que já tive em toda a minha vida.
 

Voltei para o quarto e liguei a TV. Olhei para o relógio no criado mudo e percebi que eles estavam demorando demais. Ou talvez eu estivesse ansiosa demais. Calculei as horas e vi que seria de manhã em Londres, então peguei o telefone, já sabendo que talvez levasse gritos de
 Mel por acordá-la. Liguei em seu celular. 

-
 Alô? – atendeu com a voz bem mais amigável do que eu esperava que atendesse. 
- Oi, amiga, adivinha quem é? – perguntei rindo e ela riu.
 
-
 SUA VAGABUNDINHA DE ESQUINAAAAA! QUE FALTA QUE EU TÔ SENTINDO, ACHEI QUE VOCÊ TINHA ME ESQUECIDO! – dramatizou, mas de fato, a última vez que falei com ela foi em São Paulo. 
- Nossa, nem me fala! Como você tá?
 
-
 Bem, na medida do possível, né? E você? Aposto que tá muito bem, só por essa voz alegre aí! – sempre vidente. 
- Ai que bom. Eu tô bem, sim. Não vou mentir, porque nem adianta.
 Thur e eu estamos tão... Lindos. – suspirei e ela gritou. 
-
 AIAIAIAIAIAI, PODE IR ME CONTANDO ISSO AÍ! – típico, típico, típico. Contei parte por parte para ela, desde a hora da banheira até a nossa viagem para Angra e o fato de ele estar demorando para voltar hoje. – Nossa, que bom. – falou simplesmente e eu notei algo de estranho em sua voz, como se tentasse me dizer alguma coisa. Mel é muito mais entusiasmada, ela teria feito outro escândalo. 
- Amiga, o que foi? Seu tom de voz foi estranho agora. – perguntei preocupada.
 
-
 Não é nada, não. Deixa de ser tola! É falta sua! – falou com a voz melosa e nós rimos. Conversamos sobre tudo: McFLY, Londres, contas, festas... Ela me contou que talvez mudaria de emprego e que tinha distribuído os meus currículos, pois eu tinha pedido. Ouvi um barulho e algumas risadas, então presumi que eles estivessem chegando. 
-
 Mel, espera aí só um minutinho, vou ver se são eles, mesmo. 
-
 Ok, espero sim. – concordou, e eu deixei o telefone no criado mudo, levantando da cama e indo até a porta. Como tinha deixado apenas encostada, abri com um pouco de cautela, ficando com apenas parte da cabeça para fora. 

Eu não devia mesmo ter feito aquilo.
 

As gargalhadas de
 Thur eram cada vez mais altas e ele estava com uma moça baixa, morena, abraçando-o pela cintura e sendo envolvida pelo pescoço. Nessa mão que a envolvia, ele tinha uma garrafa de cerveja e parecia dizer várias bobagens no ouvido da menina, pois ela ria incontrolavelmente. Olhei um pouco mais para o lado e vi Mica, na mesma posição, com uma loira; Chay com uma morena e Harry com outra morena. Cada um ia entrando em seu quarto, acompanhado delas. Senti as pernas tremerem e o coração bater abafado. Quando percebi, já tinha fechado a porta e sentia as lágrimas escorrerem pelas minhas bochechas. Enxuguei algumas e lembrei de que tinha deixado Mel esperando ao telefone. Nem sei como consegui andar até a cama. 

-
 Mel, amanhã eu tô voltando para Londres. A gente conversa quando eu chegar, preciso desligar. 
-
 Lu? Você tá chorando? Que foi? Pelo amor de Deus. – perguntou preocupada. 
- Nada, claro que não tô chorando – menti, tentando driblar o nó na garganta.
 
-
 E essa voz trêmula é porque você está saltitante? Claro que não. Te conheço muito bem, pode ir falando. – ao ouvir essas palavras, senti a necessidade de contar para Mel o que tinha visto. Se eu guardasse para mim, seria pior. 
- O
 Thur... Ele chegou. – respondi e ela riu. 
-
 Que bom, né? Ele te pediu em casamento? Por que você tá chorando, caramba?
- Ele não chegou sozinho,
 Mel. Estava agarrado em uma menina e eles foram para o quarto dele – falei, quase que vomitando as palavras e sentindo um aperto profundo no coração. 
-
 O QUE? QUEM ESSE FILHO DA PUTA PENSA QUE É PRA FAZER ISSO CONTIGO? VOCÊ NÃO É PALHAÇA! AINDA BEM QUE AMANHÃ VOCÊ JÁ VEM, ELE NÃO É HOMEM PRA VOCÊ. CHUTA ELE, LUA! O EXCLUI DA SUA VIDA, PELO AMOR DE DEUS! – gritou indignada e eu já soluçava. – NÃO FICA ASSIM, AMIGA. POR FAVOR! Queria tanto estar aí pra poder dar um bom soco no meio do nariz dele! Chama os meninos, os faz fazerem baderna e o atrapalhar. 
- Nem que eu quisesse.
 
-
 Por quê? 
- Porque cada um tá com uma menina agora em seus quartos. – respondi bruscamente e
 Mel prendeu a respiração. 
-
 PUTA QUE PARIU! ENTÃO QUER DIZER QUE LEVEI CHIFRE DUPLO? AH, MAS ESSES DOIS IMBECIS ME PAGAM, AH SE PAGAM! – berrou, e eu até consegui rir. – Ai, Lu, desculpa. Eu sou uma idiota. Você aí toda tristinha e eu fazendo escândalo por dois safados, filhos da mãe. Ah, mas me pagam muito. Eles dois e o Thur. Deixa só eles chegarem aqui! 
- Não,
 Mel. Deixa tudo como está. Eu não tenho compromisso nenhum com o Thur e nem você com o Chay e... O Mica. 
-
 É, você tem razão. Mas o que o Thur aprontou com você não se faz, não se faz MESMO. 
- Vou desligar, amiga. Preciso pensar. – falei sincera e ela concordou. Despedimo-nos e
 Mel me aconselhou a dormir e ter uma conversa com Thur antes de embarcarmos. Desliguei o telefone e mal tive tempo de pensar em alguma coisa. Abracei o travesseiro com força e comecei a chorar, mas não um choro normal, eu ficava praticamente sufocada entre os soluços. Como uma criança mimada. Não conseguia acreditar que aquilo estava acontecendo. Por que ele me trouxe pra essa droga de viagem, fez eu me enganar o bastante e aprontou assim, na minha cara? Eu realmente não esperava que fôssemos agir como um casal, mas tudo parecia tão certo, tão perfeito. Eu estava cada dia mais encantada por ele. Cada dia descobria uma qualidade nova e aprendia a aceitar os defeitos, que para mim nem tinham importância. Fui uma estúpida de ter me envolvido tanto! Tenho que aprender que sempre que deixo a vida se encarregar, acabo quebrando a cara. Se eu tivesse pelo menos mantido o meu pensamento de ficar sem ele de vez, talvez não estivesse parecendo aquela Lua que chorava sentada na tampa do vaso sanitário aos 16 anos por ter perdido a virgindade com um idiota. Eu me sentia praticamente da mesma forma, mas ali estava sendo pior, porque eu estava prestes a entregar o meu coração nas mãos de Thur. Eu abri o meu maior segredo para ele. Eu acreditei com todas as minhas forças que as coisas iam começar a se ajeitar. 

Mas não. Ficou tudo mais bagunçado ainda, porque agora consegui me lembrar de algo que parecia nem existir nesses últimos dias: ele tem uma namorada o esperando em Londres. E eu? Eu não tenho ninguém. Então é por isso que fomos deixados em quartos diferentes. Deve ter sido ao seu pedido. A corda sempre arrebenta para o lado mais fraco, esse é o ditado mais verdadeiro que já inventaram. E nesse caso, quem caiu fui eu.
 

Corri para o banheiro e só tive tempo de levantar a tampa do vaso, as coisas estavam realmente ficando sérias demais. Aconteceu exatamente como na festa que demos na casa de
 Mel. Ao lembrar de Thur rindo com aquela vadia, meu estômago revirou e eu tive que vomitar. Eu não consigo lembrar quando estive tão nervosa. Ele se transformou em uma doença para mim. Ou pior do que isso. Porque primeiro me mostra o paraíso, para depois me atirar no inferno. Parece ser tudo premeditado. Alcancei o papel higiênico e limpei a boca por fora. Depois levantei e dei descarga. Abri a torneira e escovei os dentes. Voltei para o quarto e percebi que haviam passado duas horas, desde a maldita hora em que os vi no corredor. Fui até a porta do quarto e a abri devagar para ver se tinha algum sinal de vida. Assim que apareci do lado de fora, vi que a porta do quarto de Mica – que ficava praticamente de frente para a minha – estava sendo aberta. Recuei e deixei apenas uma pequena brecha, para espiar. A garota que estava com ele deixou o cômodo e ele apareceu na porta apenas de boxer, sorrindo e olhando para a bunda dela ao vê-la se aproximar do elevador. Depois entrou e eu fechei a porta novamente. Era melhor evitar ficar mais tempo e ver a de Thur saindo e ele olhando para o traseiro dela assim como o amigo fez. Se vendo Mica já fiquei com nojo, com Thur colocaria todas as tripas para fora. Abri o frigobar e coloquei um pouco de água em um copo. Tomei tentando me acalmar, mas as minhas mãos ficavam cada vez mais geladas e trêmulas. 

Odiava me sentir assim por um imbecil. Fui novamente para a sacada e fiquei olhando o mar. Era incrível a diferença que poucas horas faziam em nossa vida. A algumas delas atrás, eu estava ali, da mesma forma, porém ansiosa para que os garotos chegassem logo e nos reuníssemos no quarto de
 Chay. E agora eu estava parada, pensando na razão para ter aceitado viajar com eles e na maldita ideia de Thur ter me usado – mais uma vez. 

No outro dia... 

Tudo parecia estranho naquela manhã. Era como se os meus sentimentos tivessem feito tudo mudar. Era uma manhã nublada, extremamente ventilada. Fui a última a deixar o quarto. Sairíamos do Rio assim que tomássemos café. A primeira coisa que fiz antes de apertar o botão do elevador foi colocar meus óculos escuros. Não queria sair mostrando as grandes bolsas embaixo dos meus olhos, resultado de uma noite inteira sem dormir e de incontroláveis momentos de choro. A porta do elevador se abriu e entrei, puxando a mala que carregava. Cheguei ao lobby e dei de cara com Harry, que segurava um copo de café da Starbucks e conversava com o motorista da van. Ele percebeu a minha chegada e se aproximou, dando-me bom dia e puxando a minha mala. Entregou-a ao senhor com quem conversava. Agradeci e passei direto, sentindo Harry no meu encalço.
 

- Tudo bem, Rachel? – perguntou quando conseguiu caminhar ao meu lado, já que eu dava passos apressados.
 
- Sim – respondi secamente e entrei no local onde o café da manhã é servido. Todos na mesa me olharam com um olhar baixo, envergonhado. Pude notar que Harry fez algum sinal para eles, com certeza havia notado que o meu humor não era dos mais agradáveis. Quando eu disse "todos", quis dizer "todos" menos
 Thur, que tentava ler um jornal brasileiro. Harry sentou ao lado de Chay, e a única cadeira livre era ao lado de Thur. Respirei fundo e primeiro me servi. Ouvi alguns cochichos quando passei, mas não fiz questão de falar com ninguém. Peguei um pequeno prato e coloquei algumas frutas, depois um pedaço de pão com manteiga. Voltei para a mesa e sentei ao lado de Thur, que agora estava de óculos escuros, assim como eu. Ouvi-o tossir algumas vezes e reclamar de dor na garganta para Lisa quando ela passou por nós. Todos eles pareciam ter medo de falar, comigo por perto, estava comprovado que estavam muito embaraçados pelo que fizeram na noite passada. Ouvi Harry comentar que nunca viu Lisa tão brava. 
- Caiu –
 Thur disse, juntando uma uva que caiu do meu prato e colocando-a de volta. 
- Não quero. – Empurrei sua mão e ouvi
 Mica dizer "wooow". 
Quando terminei de comer, os meninos se levantaram e deixaram
 Thur e eu sozinhos na mesa. Foi tudo muito bem planejado, como a safadeza da noite passada. Fingi não ter percebido que estávamos a sós, mas ele não parecia convencido. 
- O que você tem? – perguntou baixo e depois tossiu.
 
- Nada – respondi com os braços cruzados e balançando uma das pernas freneticamente.
 
- Eu já te conheço.
 
- Então nem devia estar falando comigo – falei, mal educada, e ele apoiou os cotovelos na mesa, colocando as mãos nas bochechas.
 
- Fala de uma vez, odeio esse tipo de coisa – insistiu, mexendo-se na cadeira e voltando à posição vertical, creio que me encarando, pois não podia ver seus olhos.
 
- Eu não entendo por que raios você me trouxe pra cá. Você não tinha nada que ter me convidado, foi tudo um erro – explodi e ele respirou fundo.
 
- Talvez tenha sido. – Deu de ombros e eu bufei, jogando o guardanapo que tinha na mão na mesa e levantei. Dei passos largos até o lobby, minhas veias pareciam querer estourar, a vontade que eu tinha era de quebrar a cara de
 Thur. Agradeci mentalmente ao ver Lisa vindo em minha direção. 
- Você quer ir à frente comigo? – perguntou, percebendo a minha expressão nada animada. Apenas assenti e caminhamos até a van, por sorte, em silêncio. Eu não estava pronta para ter nenhum tipo de conversa. Fui o caminho inteiro perto da janela, olhando para o mar do outro lado da rua, pensando no quanto as coisas tinham mudado de um dia para outro. Ouvia Lisa conversando com as outras pessoas da equipe, que iam nos bancos de trás, não conseguia ouvir o assunto, apenas as vozes. A minha cabeça estava ocupada demais pensando em como me deixei ficar tão vulnerável. Antes de
 Thur aparecer na minha vida, nem sabia o que era um coração e o que ele partido podia causar. Odeio estar passando por isso. Odeio ter saído de casa apenas para confirmar o que eu já sabia, mas achava que poderia ser mudado. Pela primeira vez, eu sentia sinceramente que tinha de me afastar de vez dele. Era isso ou passar a vida inteira sofrendo. 

Chegamos ao aeroporto e já fui para a aeronave, Lisa ficou esperando os garotos e eu procurei um lugar para sentar. O piloto brincou, dizendo que os meninos iam brigar para ficar ao meu lado. Fui um pouco rude quando disse que queria distância de todos eles, arrependi-me, pois o pobre homem não sabia de nada. Sentei perto da janela e peguei meu
 iPod na bolsa, selecionando a playlist dos Beatles e colocando os fones de ouvido. Já tinham tocado cinco músicas quando algum sinal de vida humana apareceu no avião. Era Chay. Ao ver que eu o tinha notado, sorriu fraco, fiz o mesmo e depois me virei para olhar para a janela. Os outros entraram e finalmente o lugar estava completo. Apertei os cintos e percebi que alguém havia sentado ao meu lado. Já sabia quem era só pelo perfume. Quase me cortei para conseguir ficar sem gritar com ele para que saísse do meu lado. 

- Acabou. – falou, apertando os cintos e eu fiquei sem entender, como sempre. Acabou o que? Nós dois? Novidade!
 
- Sério? – perguntei sarcástica e desliguei o
 iPod a pedido do comissário de bordo. 
- Sophie e eu. – esclareceu minhas dúvidas e eu engoli seco. Pensei muito no que falar e realmente apreciei o que disse.
 
- Bom pra ela. – tirei o cinto que já havia apertado e levantei, passando bruscamente pelas pernas de
 Thur e indo sentar no lugar vago ao lado de Harry. Ele me olhou espantado e tirou os fones de ouvido. 
- Posso ficar aqui com você? – perguntei, colocando a minha bolsa no porta-bagagem. Ele apenas assentiu, sorrindo. Sentei, cruzei os braços e fiquei fazendo o meu tique favorito com as pernas.
 
- Nervosa? – Harry perguntou, dando-me um lado de seus fones.
 
- Sim, e você não vai desligar seu
 iPod pro avião decolar, não? – olhei-o incrédula e ele resmungou, desligando o aparelho e guardando no bolso. 
- Por causa do avião ou por causa do
 Thur? – perguntou receoso e eu soltei uma risada abafada. Está tão na cara assim? 
- Ambos. – respondi sincera e agora quem deu uma risadinha foi ele.
 
- Acho que nós exageramos na noite passada. – assumiu em tom culpado.
 
- Ah, que bom que você tem essa consciência. Fiquei esperando vocês um tempão. – estalei os dedos para acrescentar drama e Harry balançou a cabeça, envergonhado. – Mas tudo bem, não sou ninguém pra ficar dando lição de moral. Nem tenho nada a ver com isso.
 
- Claro que tem, Rach. – disse, apontando para o cinto para que eu o apertasse, fiz e ele continuou falando. – Você veio com a gente, era pra te darmos toda a atenção. O problema é que quando a bebida vai entrando, a responsabilidade vai sumindo.
 
- Tudo bem, agora já passou. – dei de ombros e fixei as mãos nos braços da cadeira, pois foi anunciado que o avião decolaria. Harry riu alto ao me ver daquele jeito e eu dei língua. Senti mais uma vez como se o meu corpo estivesse se desencaixando e percebi que dessa vez não teria a mão de
 Thur sobre a minha e nem receberia um selinho roubado. De qualquer forma, se eu o visse na minha frente, seria capaz de quebrar todos os seus dentes. Quando o avião já estava no ar, pressionei o botão e deitei a cadeira, deitando em seguida. Harry fez o mesmo e tirou o Ipod do bolso, me dando um dos lados do fone. 
- Acho que o
 Thur não sabe o que faz. – comentou subitamente, enquanto trocava de música. 
- Hã? – perguntei desnorteada.
 
- Com isso de não ficar com você de vez. – respondeu, parando em uma música e a elogiando. Era Libertines! Sacudi-o, não acreditando que ele ouvia aquilo. Olhou-me assustado, por dizer também nunca acreditar que eu ouvisse aquele tipo de música. Fechei o sorriso e voltei a lembrar do que estávamos falando. Harry também ficou sério.
 
- Talvez ele simplesmente saiba o que faz. – fingi não dar importância e ele riu, negando.
 
- Eu tenho certeza que não. Porque se soubesse, ele mesmo teria terminado com a Sophie.
 
- Mas ele terminou, não? – olhei-o confusa.
 
- É, mas quem terminou foi ela por telefone. – informou-me e eu fiquei praticamente em estado de choque. Por alguns segundos, tinha imaginado que
 Thur teria sido homem o suficiente de terminar com ela. Não que eu achasse que esse seria um ato heróico para que ficássemos juntos, mas esperava que sua consciência tivesse pesado e que estivesse a libertando. 
- Nossa, nem sei o que dizer – pisquei freneticamente.
 
- E o pior de tudo é que parece que ela nem justificou. Só disse que sabia que estava sendo traída.
 
- Quer explicação melhor, Harry? – fiquei abismada e ele riu alto.
 
- É, você tem razão.
 
- Será que tem a ver com os paparazzi? – perguntei assustada e ele arregalou os olhos.
 
- Espero que não, porque isso não pode sobrar pra você! – Harry disse, balançando a cabeça e depois franziu a testa. – Vamos ver quando chegarmos. Mas eu acho que ela falaria. – tentou me consolar.
 
- Por telefone? Eu não tenho tanta certeza de que ela falaria. – opinei, fechando os olhos, e ouvi Harry fazer algum som com a boca, concordando. Começava a tocar "Can’t Stand Me Now" e Harry sussurrava a letra. Comecei a fazer o mesmo. Enquanto isso, não parava de lembrar que há alguns dias atrás estava sentada bem ao lado de
 Thur, sendo coberta por ele com seu casaco e recebendo seu abraço. Estava tão bom pensar que tudo daria certo, que tudo estava bem. Mas parece que o mundo vai e te chuta com uma força maior ainda como diz na canção que ouvia. Mesmo tudo estando estranho, os meninos com medo de mim e Thur estando a cadeiras distantes, isso não impediu ninguém de fazer bagunça. Mica e Chay colocaram aventais e ficaram brincando de comissários de bordo, servindo chocolate para todo mundo. Quando chegaram a mim, ajoelharam-se e pediram desculpas, oferecendo-me o maior chocolate da cesta. Não tive como não sorrir para eles e os desculpar. Fomos para o fundo do avião, eu ainda estava de óculos escuros, a minha cara devia estar assustadora. Thur se uniu a nós e ficamos mais uma vez jogando baralho. Nas partidas que ele ia, eu me retirava e vice-versa. Não estava nada bem. Nada. Mas tentei ficar sem pensar nisso e apenas me distraí, afinal eram muitas horas de voo. 

Chegamos a Londres e era uma manhã de terça. Peguei a minha bolsa e deixei o avião juntamente com os garotos, mal podia esperar para ver
 Mel novamente. Tinha sentido a sua falta absurdamente esses dias que ficamos distantes. Também queria contar tudo a ela – a parte boa, se é que eu ainda conseguiria me lembrar sem rancor. Vi uma grande movimentação quando nos aproximávamos do saguão do aeroporto. Havia vários fotógrafos e repórteres. Também notei a presença de paparazzi na parte externa à pista de pouso quando descemos da aeronave. Não entendia muito bem aquilo, mas vi Lisa preocupada, dizendo-nos para só sair quando os seguranças dessem sinal. Observei cerca de dez homens extremamente fortes se posicionarem na porta da sala de desembarque e um deles fazer um sinal positivo para Lisa. Começamos a andar e eu tive uma sensação estranha, como se algo estivesse errado, como se aquele movimento não fosse normal, corriqueiro. Harry foi à minha frente e Thur atrás, Mica e Chay vinham discutindo alguma coisa e reclamando de ter que enfrentar repórteres àquela hora. Quando passamos, os seguranças fizeram praticamente uma "parede", nos acompanhando. A imprensa avançava e aquilo era assustador. Harry olhou para trás para checar se eu estava bem, apenas assenti e ele sussurrou para que eu tivesse calma. 

-
 Thur, Thur, VOCÊ ESTÁ APAIXONADO POR UMA PROSTITUTA? – ouvi um repórter perguntar e senti as minhas pernas faltarem. Ele xingou o tal entrevistador e ouvi quando este falou para os outros que a "prostituta" estava na frente de Thur. 

Vi vários flashes em meu rosto quando chegamos à parte externa do aeroporto, os seguranças empurravam, mas era um aglomerado sem fim. Finalmente entramos na van, sentei entre Harry e
 Thur e foi difícil controlar a vontade de chorar. Tentei disfarçar, mas não tive muito sucesso. Chay e Mica, que estavam no banco da frente, olharam-me preocupados. Harry perguntava para Thur o que estava acontecendo, mas eu não podia ver se Thur cochichava alguma coisa ou se simplesmente ignorava. Foram os quarenta minutos mais longos da minha vida. Parecia que nunca chegaria em casa. Quando o carro parou na frente do prédio, desci como um furacão, Harry disse que as malas estavam vindo na outra van com Lisa, que depois ela deixaria lá. Apenas assenti e abracei cada um. Eles pareciam muito confusos, o único que entendeu exatamente o que estava acontecendo foi Thur e eu, claro. Depois que me despedi de Chay, vi Thur parado, escorado na van com as mãos nos bolsos, cabisbaixo. Pensei em falar com ele ou não, mas decidi apenas virar as costas e subir as escadas. Acenei pela última vez para os três e comecei a subir os degraus. Tirei os óculos, pois não havia muita claridade ali. Meu coração batia acelerado e as minhas mãos estavam geladas e trêmulas. Toquei a campainha e Mel abriu rapidamente. Ela me olhou com uma expressão triste e ali mesmo eu desabei. Abracei apertado e solucei o tanto que pude. Mel não disse uma única palavra, apenas chorava comigo e tentava me acalmar alisando meus cabelos. Quando finalmente conseguimos conversar, ela me contou que as nossas fotos na praia tinham aparecido em um tablóide e que suspeitavam que eu era brasileira. As coisas pioraram quando alguém ligou para lá e disse que eu era prostituta, que era inglesa e outra pessoa havia informado que meu nome era Lua. Não fazíamos a mínima ideia de quem podia ter feito isso. Perguntei à Mel o porquê de não ter me contado nada ao telefone e ela disse que não queria estragar o passeio. Lisa logo chegou com a mala, agradeci e ela me disse que tudo ficaria bem, eles dariam um jeito de tirar as fotos de circulação e toda aquela bagunça. Fiquei muito envergonhada e pedi desculpas, mas ela disse que aquilo não era problema seu, que não estava nem um pouco chateada comigo. 

Tomei banho e vesti um blusão de
 Mel. Passei o dia inteiro socada em meu quarto, chorando tudo o que tinha para chorar embaixo do edredom. Mel faltou o trabalho para ficar comigo. Conversamos muito pouco, porque eu só conseguia soluçar. Além de todo o fato de estar em um escândalo na mídia, o que mais me magoava mesmo era o que Thur tinha feito. Eu não conseguia esquecer a imagem dele com uma vagabunda no corredor do hotel, justamente quando tudo parecia tão bem. Não conseguia entender como ele podia gostar tanto de brincar com os meus sentimentos, com a minha felicidade. Fiquei me perguntando se estava recebendo algum castigo, se eu tinha feito alguma coisa muito ruim para estar passando por isso. Será que eu realmente mereço ter a minha cara estampada em todos os jornais e revistas como "A PROSTITUTA QUE CONQUISTOU THUR AGUIAR"? Será que eu sou uma pessoa tão ruim a ponto de ter isso reservado em meu caminho? Uma coisa era certa: eu queria morrer. Quanto mais as horas iam passando, mais eu sentia vontade de chorar. Mel me deu um calmante e foi quando comecei a me tranquilizar devido ao sono repentino. 

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