7 de abr. de 2013

Here Comes The Storm


Capítulo 3


Era sábado e eu estava andando na rua com o meu cachorro, Flows, quando encontrei-a parada na porta de um café. Estava com a cara pálida e mal se mexia. Na verdade, a única parte dela que mexia eram as mãos, porque tremiam. Sentei-me na frente dela e passei a mão na frente de seus olhos. Ela nem se mexeu. Não piscava e parecia não respirar. Sacudi-a e então ela saiu do transe, dando um pulo para trás. Bateu com a cabeça no vidro e logo se tocou que era eu. Sorriu sem graça e voltou a se sentar, mexendo o copo. Abaixou o olhar assim que seu sorriso se fechou, segundos depois.
- Aconteceu alguma coisa? - perguntei. Foi arriscado, eu sei.
 Arthur podia estar dentro do café e ver tudo. Eu tinha amor à minha vida, mas também tinha a solidariedade comigo e eu estava decidida. Não ia deixar o Arthur tomar conta dela. Podem achar isso a coisa mais lésbica, bizarra, ou mesmo estranha das suas vidas, mas se passassem uma semana como eu passei e vissem a cara de perturbada dela, iriam fazer a mesma coisa. E olhe que não troquei mais que um simples "oi" com ela, e foi no dia que ele nos apresentou.
Ela não me respondeu, então perguntei baixinho novamente. Sem resposta. Resolvi perguntar outra coisa.
- Ele está aqui? - ela negou. Ótimo, voltei a falar normal - Pode me falar; aconteceu alguma coisa? - ela fez que sim com a cabeça. Fiquei em alerta - Quer me contar? Sabe que não vou falar nada para ele. Eu estou com você - ok, essa foi uma das coisas mais fora do comum que eu disse na vida, mas caramba... Ela precisava falar com alguém. Estava escrito na testa dela.
No mesmo momento, pude vê-la levantar os olhos devagar e fazer um gesto com a cabeça para que eu a seguisse. Logo, fui seguindo um pouco distante dela. Mandei uma mensagem para
 Chay, contando o que tinha acontecido. Demoramos séculos para chegar à casa dela. Tive até que levar o meu cachorro no colo. No caminho, ela se sentou perto de uma árvore e me liguei de que aquela era a minha casa. Entendi o recado e deixei o cachorro em casa. Vi-a se levantar assim que fechei a porta. Demos uma volta inteira no parque (que NÃO é pequeno) e chegamos. Depois que fui me tocar de que a casa do Arthur era no caminho. Ela era esperta; eu sabia. Tinha passado por trás da casa dele. Que safada! Aposto que ela faz isso toda hora. A mesma abriu a porta e bateu os pés no tapete. Imitei-a e entrei. A casa dela era um amor. Toda fofinha e quentinha. Parecia aquelas casas de boneca que aparecem em revistas. Ela sorriu ao passar pela sala e ouvi pela primeira vez na minha vida a voz dela. Acredite você ou não, mas Arthur não deixou que ela me respondesse, depois que eu disse "oi", quando nos apresentou. Ele tinha ciúmes da voz dela? Se for isso, QUE ridículo!
- Oi mãe - acenou e parou, olhando-a. - Essa é a
 Melanie. É do meu colégio, amiga do Arthur.
- Olá - a mãe dela sorriu e me deu dois beijinhos.
- Algum recado?
- O de sempre - todo mundo usava o código "O de sempre" ou era só impressão minha? Ah. Ela sorriu entendendo a minha falta de compreensão na frase da mãe dela. Apoiou uma mão no corrimão da escada.
 
- Eu ligo depois para ele - subimos a escada e entramos no quarto dela. Era um quarto super normal até. Uma parede era roxa e três eram brancas. Os móveis eram todos brancos e a colcha da cama dela, de um verde vivo. Sorri e sentei depois dela tirar os sapatos e se sentar encostada ao travesseiro. Jogou-me uma almofada e olhou a porta. Devidamente fechada - Oi - ela sorriu abertamente. Meu Deus, que gracinha o sorriso dela. Tão fofo – Chamo-me
 Lua. Prazer - eu disse que ela devia ser legal - Desculpe por essa semana. Ele está meio... Atordoado com o começo das aulas.
- Acho que você já sabe quem eu sou - ela riu baixo e concordou - Tudo bem. Não é de hoje que conheço o gênio - ela riu de novo. Ficamos um tempo em silêncio e logo ela o cortou.
- Aposto que você quer saber de tudo, não é? - ela me perguntou, mas não de uma forma grossa. Foi de uma maneira natural.
- Quero saber o que aconteceu. Se não quiser falar, não tem problema.
- É só que... - a cara de pavor dela voltou. É para eu ficar com medo? Porque me assustou um pouco. Confesso - Eu respondi ao menino do segundo ano, da sala da frente da de vocês.
- E daí?
- E daí que ele disse “oi” e eu respondi outro baixo, mas ele ouviu. Aí ele sorriu e eu... - ela parou de falar e olhou para o vazio.
- O que aconteceu?
- Se ele souber que eu falei com o menino, vai acabar com ele e vai brigar comigo. Ele disse que, se eu falasse com alguém esse ano, ia me bater... Bater em mim! - ela arregaçou as mangas da blusa de manga comprida e pude reparar em um roxo na parte inferior do braço dela. Apontei para o roxo e ela logo o escondeu, sorrindo sem graça - Mas minha mãe não sabe.
- O que é isso? - voltei a apontar para o roxo. Não podia ser o que eu achava que era. Podia?
- Não é nada. Eu bati na cama outro dia. É normal... Sou desastrada - ela riu e eu me aliviei - Enfim, ele não me deixa fazer nada que não seja com ele. Eu minto para a minha mãe, dizendo que saio com outras meninas, porque saio todo dia com ele.
- Sua mãe não gosta dele?
- Só falou com ele pessoalmente algumas vezes e ele é o amor da vida dela. No ano novo, ele ligou quase que do outro lado da Inglaterra para falar com ela. Minha mãe disse que ele ligou para agradecer pela filha que ela tem - sorri. Jura que ele falou isso? Não é típico dele - Minha mãe é apaixonada por ele. Cansei de pegar os dois se falando no telefone. Ele vem de vez em quando aqui para vê-la, mas é raro. É tipo... Uma vez a cada mês, e não foram tantas assim.
- E por qual motivo ele não lhe deixa fazer nada?
- Ele acha que eu sou vulnerável a qualquer coisa. Desde a poeira do chão, até uma bala perdida. Eu não ligo muito; é o jeito dele. Ele acha que tem que me proteger das pessoas más - ela riu – Deixo-o fazer o que quiser. Realmente não ligo muito. Ele é uma pessoa legal e só quer o meu bem. Do jeito dele, mas só quer meu bem.
- Ele não pode querer o seu bem tratando você desse jeito.
- Eu sei e eu estou com medo da escola na segunda. Ele vai saber. Ele sempre sabe.
- Não se preocupe. Eu vou estar lá - a mesma hora, ela deu um pulo da cama e segurou minhas pernas.
- Não! Não, não, não, não, não. Por favor, não fale comigo. Se ele souber que eu falei com você, estou frita.
- Ele é doente? - ela calou a boca e sentou, fechando os olhos. Eu sabia que tinha alguma coisa metida ali no meio.
O telefone dela tocou e pude ver o nome dele na Bina. Levantei-me, dizendo que ia embora e ela fez sinal para que eu esperasse. Atendeu ao celular com a voz suave.
 
- Não tem nada a ver. Eu juro para você. Que coisa! Não, eu não sei e não quero... - ela olhou o telefone e jogou-o na cama - Ele está vindo para cá.
- E agora? - olhei para ela, um pouco assustada. Ouvimos a campainha. O safado já devia estar lá fora quando ligou. Saímos correndo pelo quarto, feito baratas tontas, e eu me joguei para dentro do armário dela. A sorte é que tinha uns buracos que dava para ver e respirar. Até que era confortável lá dentro. Ela se certificou de que eu estava tranqüila e se sentou na cama, olhando para o chão. A porta bateu e pude vê-lo parar ao lado dela.
- Levante - ele falou curto e grosso. Ela se levantou sem jeito e eu fiquei com receio de que ele fizesse alguma coisa - Vai me explicar?
-
 Arthur, ele falou um simples “oi”. OI. O-I. E eu respondi “oi”. OI. O-I. Eu não insinuei nada e nem fiz nada, a não ser responder a ele. Você não pode controlar tudo o que eu faço - hum, corajosa. Ele pegou uma almofada, apertando-a com força.
- Mas você sabe que não foi isso que eu disse.
-
 Arthur, você não me deixa falar com ninguém que não seja você ou minha mãe. 
- Que cheiro é esse? Esse perfume não é seu - ele a ignorou, cheirando o ar. Olhou feio para ela.
- É meu, sim. Eu comprei, ok? E dá para parar? Eu tenho minha vida! - ela não tinha medo do perigo, olhe. Se fosse o
 Chay, já tinha corrido - E ela não gira em torno de você! - pediu para morrer.
Ele foi apertando cada vez mais a almofada. O rosto dele foi ficando cada vez mais vermelho e as veias pareciam que iam saltar. Ele jogou em um movimento mudo a almofada na parede e ela estourou, se transformando em um monte de peninhas caindo pela parede dela. Ela se levantou, foi até o banheiro e voltou com o cabelo preso em um coque frouxo. Ele se sentou na cama e esticou o braço, olhando baixo - Se você...
- Eu não vou - ele a olhou indiferente - Venha aqui - ela suspirou e pegou na mão dele. Ele a puxou para seu colo e a prendeu ali, a abraçando fortemente - Desculpe - OI? O
 Arthur falou isso? Essa menina tem o poder. É sério. Vou pedir para ela mandá-lo lamber o chão da quadra do colégio. Será que ele obedece? - Eu quero você só para mim.
- Mas,
 Arthur, eu não estou saindo com outra pessoa - ela sorriu fraco, mexendo no cabelo dele.
- Mas eu quero. Eu quero que você passe todos os dias comigo, que passe o dia em casa e me esperando voltar. Que cuide dos nossos filhos, que passe o dia cuidando de tudo que é nosso.
 
- Mas nem temos dinheiro para isso ainda. Somos totalmente dependentes.
- Não fale isso - ele a olhou feio, mas logo voltou a olhar para as pernas dela, brincando com as mãos ali - Eu não gosto que olhem para você e que falem com você.
- Mas você não pode proibir isso.
- Posso, sim. Você é minha namorada e eu posso o que eu quiser.
- Mas e se eu não quiser? Eu gosto de falar e de conversar também.
- Então converse comigo.
- Mas, amor, você não é uma menina com quem eu possa conversar sobre... Sei lá, sobre esmaltes.
- Eu converso sobre esmaltes com você. Eu aprendo sobre eles. Sério - ela riu. Como ela pode rir? Eu nem sei o que teria feito numa hora dessas.
 
-
 Arthur, se eu estou com você, é porque gosto da sua pessoa. Se não, eu estaria com outro. Não é mesmo?
- Mas você não me ama.
- Ai meu Deus - ela riu de novo. Descobri o problema dele. Ele era carente!
 Melanie, você é um gênio!
Ela segurou o rosto dele com força e riu mais, sorrindo.
- É claro que rola um sentimento grande por você. Senão, eu não gastaria meu tempo.
- Então diga que me ama.
- Prometa-me uma coisa antes - ele confirmou - Sem essa de proibir todo mundo de falar comigo.
 
- Mas, amor, eles podem olhar para você... Falar de você... Falar COM você. Eu não quero isso. Você é muito pequenininha e frágil.
- Eu não sou nada.
- É, sim, e não venha discutir comigo.
- Ok, mas falar é outra coisa.
- Eu quero a sua voz só para mim - ai meu Deus, jura que ele é maníaco assim?
 Chay não me contou isso. - Mas... - ela riu. Não tinha o que falar. Fato - Pare com essa besteira, Arthur. Se quiser, eu falo o dia todo com você.
- Mas você já faz isso.
- Porque você me obriga.
- Mas a sua mãe...
- Olhe só: se você continuar com isso...
- Está bem. Eu já parei - ele a abraçou. Eu disse que ela tem o poder, ha! - Sem essa de proibição. Agora fale.
 
- Não acredito. Deixe de ser carente - ela passou a mão na cara dele que riu - Eu amo você - disse baixinho, olhando para ele. Ele sorriu e a apertou mais. Logo, se beijaram e eu já estava cansada de ficar naquele armário.


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